"O café é muito conhecido, pelo menos ali na zona. Pela positiva. Jovens e graúdos gostam de passar por lá. Sentam-se, encostam-se ao balcão, pedem para levar para casa. Um croassant. Mais. Há quem prefira um brioche ou húnguro (eu!). Sento-me no canto, perto da janela. Gosto de olhar lá para fora, ver quem passa. Mas gosto de observar aqui dentro também. Não é por ser curiosa. Não é por não ter vida e precisar da dos outros. Apenas me dá uma boa sensação observar o comportamento de quem me rodeia. Conhecendo ou não. Imaginar como, porquê, o que passará na cabeça, na vida.

Hoje entram e saiem pessoas rapidíssimo. Devem querer aproveitar a trégua que as nuvens nos deram. Entram animadas e vão-se embora com um sorriso maior ainda. Estão ocupadas uma mesa de três e outra com um casal de miúdos. Mais uma ao fundo com duas amigas. Na primeira, apenas com pessoas acima dos 75, bebe-se chá e comem-se três croassants à velocidade de... nem sei! Conversam animadamente, riem-se, a senhora esconde os dentes com a mão direita e baixa os olhos como que envergonhada. Com aquela idade e ainda envergonhada, eu, que nada ouço sobre o que falam, dou largas à imaginação. Estarão a falar de algum momento distante, ainda muito nova? É possível.. Os miúdos, sentados lado a lado, olham-se deixando transparecer a paixão que sentem. Sorrio, é bonito de se ver, desde que não entrem no exagero. Dispenso, guardem isso para quando não tiverem espectadores. Chegam mais miúdos. Conhecem-se. Terão combinado? Sentam-se todos na mesma mesa. Ucal de chocolate, croassant simples, croasssant com fiambre, torrada, merenda mista. Todos conversam com entusiasmo. Provavelmente sobre a noite de ontem. Quem viram, o que aconteceu, o que não aconteceu. Ele continua como braço por cima do ombro dela. Tranquilamente, como se da coisa mais banal se tratasse, afasta-lhe o cabelo e dá-lhe um beijinho no pescoço. Como se nada se tivesse passado, ela continua alegremente a falar, num milésimo de segundo os cantos da boca levantam esboçando um sorriso. Ele sabe que sim. Ela também.

Lembro-me, preciso comprar meias!"

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